2010/02/17

Pinguinos 2010 - Valladolid [3/3]

Por: Rui Viegas Gago

ETAPA 3 – REGRESSO
2010.0110

Dia de regresso, estava a acabar o fim de semana, ou talvez não...
Sem madrugar, iniciamos o dia cedo. Os painéis informativos das auto estradas no dia anterior avisavam os motociclistas para sairem cedo para casa já que se esperava um grande nevão para a tarde do dia de hoje. Sem poder madrugar já as estradas estariam geladas a essa hora, lá nos fizemos à estrada por volta das dez horas locais.

Seguimos com a caravana dos nossos amigos e companheiros de viagem até Salamanca onde nos separámos. Daí seguimos as quatro motos, sempre com temperaturas na ordem dos zero graus centígrados, para não variar, seguimos em direcção a sul rumo a Béjar, Plasencia, Cáceres, Mérida.
Depois de cerca de 200 quilómetros sem neve eis que esta faz novamente a sua aparição quando estamos a chegar a Béjar. Ainda assim a estrada mantinha condições de aderência aceitáveis e seguimos viagem sem grandes percalços, ainda que sempre em velocidades moderadas.
De Béjar a Mérida o nevão começou a fazer-se sentir cada vez mais e a visibilidade começou a ficar cada vez mais reduzida. Começamos a ultrapassar com bastante frequência companheiros de estrada com motos menos preparadas para viagem o que dificultava imenso a sua progressão e começamos a assistir a uma experiência nova...
As nossas motos começam a congelar em pleno andamento, os pára-brisas, faróis, suspensão e restante frente das motos têm já mais de um centímetro de gelo colados e os capacetes e viseiras começam igualmente a congelar. Tínhamos consciência que estávamos em pleno nevão e os flocos de neve tinham tal dimensão que bastava um colado na viseira para perdermos a pouca visibilidade que ainda tínhamos.
Os cinquenta quilómetros antes de Mérida foram feitos em velocidades na ordem dos 60km/h, grande parte deles com as viseiras dos capacetes congeladas e portanto, abertas. As condições de aderência eram neste momento quase inexistentes e procurámos uma área de serviço para parar e nos abrigarmos.
Neste momento já não havia condições para seguir viagem em segurança e a próxima paragem a seguir a Mérida é Sevilha, a cerca de 200 kms o que seria uma distância demasiado grande para vencer nas condições que estávamos a experimentar.
Parámos na área de serviço seguinte, mesmo à entrada de Mérida e abrigámo-nos no restaurante. Aqui tentámos entrar à conversa com diversas pessoas tentando aferir as condições habituais das estradas na região de modo a podermos planificar o nosso regresso a casa.
Após algumas opiniões dos empregados do restaurante e de alguns camionistas chegámos à conclusão que a estrada para Sevilha seria impossível de fazer. Segundo as opiniões das pessoas, estaria já fechada ao trânsito. Restavam-nos duas hipóteses, ou ficávamos por ali, aguardando a noite e esperando que o dia seguinte amanhecesse com melhores condições climatéricas ou seguíamos para Badajoz.
Dos relatos das pessoas, percebíamos que, em condições normais, a faixa da direita da estrada estaria transitável mas esta não eram condições normais. As mesmas pessoas diziam que este era o maior nevão dos últimos trinta anos em Mérida. Lá fora a altura de neve aumentava a todo o instante e agora até andar a pé era um desafio pois começara-se a formar uma camada de gelo sob a neve.

Uma coisa era certa, não podíamos aguardar mais se pensávamos em sair e, um pouco relutantes, saímos. Chegámos às motos sem cair o que não foi mau, mas por outro lado a falta de aderência da estrada retirou-nos completamente a confiança para colocar as motos em andamento. Indecisos, eis que um semi reboque holandês se fez à estrada e nós aproveitando os rastos dele por entre a neve, sem hesitar fomos atrás sem sair dos trilhos deixados pelos rodados duplos. Daí à estrada foi um breve momento e nesta, apesar de com poucas condições circulava-se. Os 60 quilómetros de Mérida a Badajoz foram feitos sempre em ritmo muito lento com as luzes de emergência ligadas mas foram feitos sem nenhuma surpresa ou acidente.

Estávamos agora em Portugal e a neve deu lugar à chuva mas apenas por breves instantes já que começou novamente a nevar. As portagens da A6 tinham cerca de um vinte centímetros de altura de neve mas não havia quaisquer avisos de perigo. Depois de alguma dificuldade em direccionar as motos para os pontos de retirada dos tickets da portagem lá seguimos viagem pela neve. Poucos metros depois de entrar na A6 percebemos logo as diferenças entre circular em Portugal e circular em Espanha. Não havia sal nas estradas. A aderência era agora quase inexistente e qualquer mínimo rodar de punho fazia a roda de trás começar a patinar e a traseira da moto a dançar da direita para a esquerda e de esquerda para a direita!!!
Pouco mais à frente começamos a ver os acidentes, diversos carros que se tinham despistado ainda estavam atravessados na auto estrada. Era o caos! A aderência não existia mas não podíamos parar pois com o tempo sempre a piorar, parar significava perder todas as hipóteses de chegar a casa. À entrada dos viadutos éramos ainda surpreendidos com o piso destes completamente congelado o que só não nos atirava ao chão por muita sorte e precaução nossa.
Foi assim até Évora onde ainda nevava, muito pouco, mas ainda se viam pequenos flocos de neve no ar

O pior tinha passado e agora restava-nos cerca e 225 kms que fizemos sempre por estradas nacionais por Beja, Mértola, Castro Marim até Tavira. A adrenalina estava ao máximo, fizemos uma última paragem em Beja para repousar e para nos despedirmos porque dali o Manuel e o Rui seguiram em direcção ao Barlavento e eu e o Madeira seguimos para Sotavento. De Beja a casa foi um instante, sempre a chover torrencialmente e de noite, mas foi um instante e nem o cansaço nem a chuva nos atrasou! A estrada molhada e chuva torrencial nunca me tinha parecido um piso tão bom e tão fiável como naquele dia onde comparativamente com o que já havíamos passado, parecia um passeio de domingo até à praia!

2 comentários:

Jorge Lami Leal disse...

Venham mais passeios destes... mas por mim pode ser mesmo sem neve, para apreciar a estrada de outra forma.

Grande aventura a vossa!

Rui V. Gago disse...

Houve quem tivesse ligado para casa a sizer que não ia conseguir chegar nesse dia... tais eram as condições!!!
Para o ano que vem há mais...