2010/02/20

Para lá do Purgatório (2009-2-20)

Por: Jorge Lami Leal

Olho em minha volta. Ninguém. Corro o fecho do casaco, ponho o capacete e coloco a chave na ignição. Rodo-a. As luzes acendem. Ligo a moto. Na fracção de segundo a seguir, sinto um sorriso crescer na minha expressão, em acto reflexo. Olho novamente em minha volta. Ninguém. Estou sozinho com a máquina, que me transmite as vibrações do motor e me despertam mais um pouco os sentidos. Ainda é cedo.


Rodo o punho e a moto desliza na estrada… sublime. Tenho destino: Estoi. Ela encaminha-me para lá. Quem sabe o que nos move ou nos impele, será que a condução é algo calculado e racional, ou um conjunto de sublimes sinapses que, quase por instinto, nos fazem dirigir este monstro de ferro e plástico? Nem me importo muito com isso, desde que faça o caminho. Sigo em frente, passo à frente de mim próprio por momentos. Abandono a tralha que acumulei na cabeça durante a semana, as preocupações, tudo ficou para trás, onde é suposto ficar. Naquele momento, nada disso é importante ou faz diferença. Qualquer diferença. Caminhos perdidos que vou encontrando, novas formas de chegar até mim vou descobrindo. Encontro-me perdendo-me. Ou o inverso, ao contrário, reverso, de novo igual a mim mesmo. Percebo coisas que não vejo de outra forma. A falta de objectividade quotidiana, no meio do ruído das nossas vidas apaga-se, abafa-se no preciso momento em que me perco na estrada – ou que me encontro nela!



Passo um pequeno cruzamento, umas casas, uma ponte velha. Qualquer dos sentidos origina um destino. Igual ou diferente, quem sabe? E interessa? Não! Todos os caminhos nos levam ao mesmo lugar. Todas as escolhas nos levam para o futuro. Mas não até ao futuro. Uma vez lá, qualquer dos caminhos que não usarmos, não será mais do que mero passado. Não existe presente. Esse conceito estático não é mais do que estético. Precisamos dele para pensar que existimos. Que nada… vivemos apenas de passados. Sentimos! Agora não é mais do que algo que já foi … O futuro não nos muda, nunca lá chegaremos. O passado sim. Vivemos no lapso de tempo que nem é futuro, nem chegou a ser passado. Mas nunca é presente! É neste espaço no meio de nada que vivemos! O “agora” termina no preciso momento que pensamos nele… e que por isso já passou. Viver é isto, é continuar a deixar passado. É acelerar devagar ou depressa, é pensar no futuro como algo que queremos passado. É tentar chegar lá o mais próximo que formos capazes. Se um dia lá chegarmos, seremos uma memória de nós próprios. Somos por isso, e em resumo, passado.



É a este passado refrescado que chego. Estoi. Uma aldeia diferente. Uma povoação cuidada e que merece sem dúvida a visita. Neste caso foi lá que combinamos o ponto de encontro de mais esta aventura. Estacionei a moto mesmo ao lado do café Vanessa. Não deixa de ser uma nota de humor, já que habitualmente partimos da pastelaria Veneza, em Tavira, e agora calhou a Vanessa. Vamos nessa?



Como troquei as horas e despachei-me antes do que necessitava, cheguei muito mais cedo e tive oportunidade de sentir o sol espreitar lentamente sobre o casario que circunda a praça central, descobrindo-a. Com a Igreja Matriz sobranceira e o Palácio de Estoi de esguelha, ali fiquei a contemplar um pouco. Estes momentos são deliciosos.

Café Vanessa - Estoi

Igreja Matriz de Estoi





Bica (antigo bebedouro dos animais)

O grupo começou a chegar e a compor-se. Tivemos tempo para tomar o pequeno-almoço (os folhados mistos são uma especialidade) e conversar um pouco.


Este passeio levou-nos por estradas bem secundárias. De Estoi, pela Bordeira, até Loulé. Dali direitos a Boliqueime, mas sem lá chegar. Fomos até Paderne pelo Caminho Municipal 1180 e Estrada Nacional 1175. O nosso objectivo intermédio era visitar o açude do Castelo de Paderne, um dos castelos que figuram na nossa Bandeira Nacional, que tem a particularidade de ter sido construído em taipa, durante o período de ocupação almóada. É pena que o abandono a que foi votado, ao contrário de outros, tenha praticamente destruído tão importante património nacional.

As quatro motos (BMW's R1200GS; R1200RT; R1150RT; R1200GS Adv.)

O açude do Castelo de Paderne

O teste absoluto à membrana Gore-Tex ® das minhas botas


Açude (com o moinho de água ao fundo)



O que dizer sobre o açude? A corrente estava muito forte, mercê das chuvas incessantes deste Inverno. Tivemos tempo para respirar fundo, trocar umas palavras e seguir novamente viagem. Esta parte do trajecto foi feito em estrada de terra, com bastantes buracos cheios de água e muita pedra, mas nada que não se conseguisse transpor, mesmo numa moto de estrada. As duas maxi-trail do grupo deviam ir um pouco mais à vontade!





Passamos o Purgatório... e fomos ainda mais além. Este também era um objectivo deste passeio: ir além do Purgatório. Grande viagem!!

Não disse que iamos além do Purgatório?!?!

Chegamos pouco depois a São Bartolomeu de Messines e seguimos pela Estrada Nacional 264, direitos a Benaciate. Pouco depois entrávamos no Enxerim e, logo a seguir, Silves. O Castelo lá em cima – é o maior do Algarve – parece feito de fogo, devido à cor da taipa, das pedras e do revestimento aplicado aquando da sua construção (também tem origem islâmica, como quase todos os outros).

O Castelo de Silves a dominar o horizonte
Biblioteca, Igreja Matriz e Castelo de Silves

Seguirmos pelo interior, passando Odeleite e entrando na Estrada Nacional 266 até Monchique. Esta estrada não está muito boa, necessita realmente de alguma manutenção. Mas vale a pena por ser diferente e nos levar adentro deste Algarve diferente.



Pouco tempo depois chegámos ao nosso destino: um café no largo central de Monchique, para umas bifanas, sandes de presunto e estrada novamente…

Monchique

Fizemos o regresso pela fantástica estrada do Alferce até São Marcos da Serra (com piso seco e limpo então, esta estrada é do melhor!!) e dali até à Via Infante de Sagres, que nos levou até casa.







Foi uma bela volta!!

... e começam os trabalhos para a organização da próxima volta! Aceitam-se quer sugestões, quer "inscrições"!!

14 comentários:

Rui V. Gago disse...

Bela volta! As sandes de presunto gigantes é que faltaram e o pão caseiro também mas ainda assim... valeu bem a pena! Pena foi o regresso ter de ser precipitado por estradas menos trabalhosas devido a compromissos inadiáveis...
Sugestões!? Eu sei mas não digo! lol

Jorge Lami Leal disse...

É uma chatice... lá teremos que voltar a Monchique... para o pão caseiro! :-p

Rui Pacheco disse...

Podemos combinar para o próximo sábado, se não for antes...

Jorge Lami Leal disse...

Antes? Sim... antes, antes... vou "levantar" uma "surpresa de 2 rodas" na próxima quarta-feira à tarde... e quero experimentá-la, pois devolvo-a no dia seguinte!!

Já no próximo fim-de-semana não dá para mim, vou à tua cidade natal no sábado e domingo tenho almoço com a familia toda! Mas vão e façam-me inveja... ou poupem a vontade para sábado irmos até Palmela por estradas mais tortas... :-p

Anónimo disse...

Se te referes a sábado, dia 6 de Março, está combinado ;-)
Não posso ir todo o fim de semana, mas dia 6 posso "tirar" umas horas ;-), é que a minha irmã faz anos, e por isso, não dá para o dia todo...

Francisco Coelho disse...

Bela voltinha magrebinos marafados ... é assim mesmo, dêem-lhes sem dó ;-)

Rui V. Gago disse...

Nós damos! e Tu!?? Quando dás!!? Vá lá...

Francisco Coelho disse...

Estou a atravessar uma fase ... digamos pseudo - introspectiva, assim tipo Urtigão (o personagem da Disney ... :-))))).
Mas isto mais cedo ou mais tarde passa ... é a idade ;-)

Jorge Lami Leal disse...

Idade? Só o que é datável com carbono 14 é que tem idade!!! Venha o nosso almoço… já faltam poucos dias!! ;-)

Rui V. Gago disse...

Poucos!!! Ainda falta para lá de uma eternidade!!! Até lá não se acabe a pólvora ao Urtigão!!! lol

Anónimo disse...

Belo Passeio...
Quanto às inscrições e/ou propostas vou ficar atento...porque prometem.

Até breve,

Pedro Bastos

Jorge Lami Leal disse...

;-)

Fil disse...

Pesquisava eu viagens e encontrei este Blog.
O meu nome é Filipe e sou de Portimão, e procurava malta para passeios. Tenho uma R1100RT.

Deixo o meu contacto, filipedesigner@hotmail.com

Bons passeios
Filipe Simões

Jorge Lami Leal disse...

Filipe!

Passeios é o que mais fazemos por aqui e és bem-vindo ao grupo.

Adianto-te que encontramo-nos aos domingos de manhã na Praia de Faro, no café da Estalagem Aeromar (logo à esquerda, assim que se sai da ponte e entra na ilha)… as BMW devem estar estacionadas à entrada do café. ;-)

Aparece!! Este é muitas vezes um ponto de partida para a organização de passeios e viagens!

Existem mais pessoas de Portimão que aparecem com regularidade.

Enviei-te um e-mail!